PORQUE AS VIÚVAS É UM PESO DE PAPEL

18.12.2018
Por Rafael Tavares

As personagens principais do filme As Víúvas – foto divulgação

O cinema sempre foi uma grande ferramenta de incutir – ou repercurtir – certos temas em voga, considerando o período em que o filme é originado. Se buscarmos em nossas mentes, sempre vamos encontrar algum filme que seja um símbolo de um determinado assunto. Para facilitar, vejamos, por exemplo, o caso do recente Infiltrado na Klan. O filme do Spike Lee dialoga de maneira primorosa com o momento em que vivemos, trazendo à tona o debate sobre o racismo e como o ódio nasce em terras fertilizadas por pura ignorância. Tudo isso conduzido por meio de uma história cativante, que não desrespeita o espectador.

Carrego comigo um modus operandi para decidir se um filme merece um lugar na minha memória ou se apenas irá para a prateleira de “gostaria-de-nunca-ter-visto-esta-merda”: uma história bem contada.

Parece que todos os envolvidos na produção de As Viúvas, filme que discutimos no Grupo Cinema Paradiso no domingo passado, se esqueceram como isto é feito. Todos os eventos ocorrem de forma atabalhoada, desconexa e que só me fizeram descolar do que estava sendo projetado aos meus olhos. Os temas inseridos no filme são retalhos mal e porcamente colocados em um monte de frases soltas dos personagens, trazendo consigo uma complexidade nula. Ao tentar falar sobre tudo, o filme se tornou a famosa “encheção de linguiça” para sustentar esta adaptação do livro “As Viúvas”, de Lynda La Plante, lançado recentemente no Brasil. 

Personagens incoerentes com o próprio discurso (ao reunir um grupo de mulheres para o serviço, a líder diz que elas precisam “agir como os falecidos maridos”). As motivações rodeiam apenas o que todos os homens fizeram ou deixaram de fazer. Nada ali foi fruto de uma mudança de pensamento e comportamento dessas mulheres. Elas apenas são levadas pela correnteza fecal que verte da mente do diretor Steve McQueen e da escritora Gillian Flynn, que desenvolveram o roteiro. 

É triste perceber que a oportunidade de retratar mulheres fortes foi perdida. Também temos a inserção do discurso racial e social nesta história com um diálogo solto vindo de um personagem em situações avulsas. Muda a cena e tudo aquilo parece ter sido esquecido. 

Para não ser completamente injusto com o filme, ele possui tomadas muito bem feitas, como a cena de discussão realizada em um carro em movimento filmada em plano-sequência, assim como a cena na quadra de basquete. São pequenos oásis em um deserto de erros.

Em dado momento do filme, alguém vira para uma das personagens e a chama de “peso de papel”. Pensando bem, acredito que o termo é muito feliz para descrever o filme: reviravoltas tolas e rasas, personagens sem peso, temas “atuais” pincelados para dar um ar de relevância que não existe. Creio que o título oficial do filme poderia ser Peso de Papel. 

Da mesma forma, os atores e atrizes foram escolhidos a dedo para que pudessem tentar dar uma “importância” ao filme. Importância que não existirá em minha vida.

1 comentários:

Grupo Cinema Paradiso disse...

Caro Rafael, compartilho da sua opinião sobre o filme. Achei que o filme fica indeciso entre querer alto rendimento comercial e fazer um filme reflexivo. Elenco primoroso, a começar por Viola Davis, mas com personagens rasos. Achei o filme decepcionante...
Cláudia Mogadouro