Algumas notas sobre o Filme “Napoleão” (2023)

 06.12.2023
Por Fernando T.H.F. Machado

Existem poucas pessoas capazes de influenciar o mundo, mesmo séculos após sua morte, e com certeza podemos dizer que Napoleão é uma delas. General brilhante, visionário, estadista ou apenas um tirano sanguinário com insaciável sede de poder?

Ao assistir ao filme do diretor britânico Ridley Scott (que também dirigiu Blade Runner, Alien - o 8º passageiro e Gladiador), podemos notar uma figura complexa, multifacetada e, por vezes, comicamente trágica, como mostram as cenas em que Bonaparte tenta, a sua moda, relacionar-se com sua primeira consorte, Joséphine.

A película ousou ao procurar mostrar, em pouco mais de duas horas e meia, a incrível vida que Napoleão teve, abrangendo o turbulento período após a Revolução Francesa de 1789, a tomada do poder em que foi nomeado Primeiro Cônsul, o chamado Império Napoleônico e, após o breve retorno a Paris vindo do exílio na ilha de Elba, o derradeiro governo (que durou 100 dias), a derrocada em Waterloo e o exílio final, na longínqua ilha de Santa Helena.

Pode-se dizer que o filme procurou satisfazer aos gostos de vários públicos: os amantes da História (dentre os quais eu me incluo), os que gostam de ação e batalhas épicas (idem) e, também, os que gostam de ver o lado humano oculto das personalidades históricas.

Nessa jornada acelerada, erros e omissões são inevitáveis: sabe-se que Napoleão era canhoto, mas o ator Joaquin Phoenix (que o interpretou de uma forma geralmente contida e sem mostrar o grande carisma do personagem), claramente assinou documentos com a mão direita. Também não se viu em nenhuma cena a mão dentro do casaco que, ao lado do chapéu de feltro preto, era a marca registrada de Bonaparte.

Um fato interessante foi o filme ter apresentado, na cena do casamento, Joséphine como tendo nascido em 1767 quando, na verdade, ela nasceu em 1763 e era, portanto, mais de cinco anos mais velha que Bonaparte. Essa aproximação de idades realmente ocorreu nos documentos oficiais da época.

Aliás, o nome de batismo dela era Marie Josèphe Rose Tascher de La Pagerie, e Joséphine teria sido um apelido dado por Napoleão com base em seu segundo nome que, no final das contas, a deixou famosa por essa alcunha.

Voltando ao ator principal, também pode ser dito que ele era velho demais para mostrar os precoces feitos militares de Napoleão (a exemplo de sua nomeação para general de brigada, que ocorreu quando ele tinha apenas 24 anos).

Já a atriz que interpretou Joséphine (a bela e talentosa Vanessa Kirby) é, na verdade, 14 anos mais nova do que o ator Joaquin Phoenix, invertendo assim a realidade histórica sobre a diferença de idade do casal.

Assim, foi radicalmente modificado todo o modo como vemos a dinâmica da relação entre os dois, num verdadeiro desserviço às figuras históricas de Joséphine e Napoleão. O ideal, portanto, seria apresentar os personagens de Bonaparte e Joséphine com, pelo menos, dois atores e duas atrizes, mantendo a diferença de idade real do casal.

Uma pequena curiosidade para nós aqui no Brasil: Maria Luísa, a segunda esposa de Napoleão, era irmã da nossa Imperatriz Consorte Maria Leopoldina, que foi casada com Dom Pedro I.

As sequências de batalhas épicas são mostradas de forma bem realista na película, mas de modo geral faltou um maior detalhamento geográfico para o público leigo, que poderia ter sido bem melhor ilustrado com a inclusão de um mínimo de cenas com Napoleão, por exemplo, discutindo com seus generais mapas das regiões onde ocorreram as famosas batalhas em que liderou o exército francês.

Em minha modesta opinião, o resultado final alcançou cerca de dois terços do que se propôs pois, no exíguo tempo de que dispunha, o filme pareceu mostrar em câmera mais que acelerada esse complexo mosaico que foi a carreira e a vida pessoal dessa fascinante personalidade histórica que foi Napoleão Bonaparte. Em resumo, trata-se de um bom filme, mas não um filme memorável.

Nota: Agradeço à minha esposa Ana Lúcia pelas observações atentas, dicas e correções sem as quais o presente texto não teria sido possível.

Fernando T.H.F. Machado é Economista e admirador da Sétima Arte.

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