41ª Mostra Internacional de São Paulo
Filme: 24 Frames

23.10.2017
Por H. Hirao

24 Frames
Direção e roteiro: Abbas Kiarostami
Irã / França, 2016, 120 minutos

Eu trabalho no centro de São Paulo, em um prédio de frente para o Vale do Anhangabaú. Depois do almoço, costumo tomar uma xícara de café observando a paisagem pela janela: o movimento no Viaduto Santa Ifigênia, os carros na Avenida Preste Maia, os ônibus no terminal Correios, a entrada da estação São Bento do metrô, os urubus sobrevoando a cidade. Vocês não imaginam a quantidade de urubus no céu de São Paulo. É um tempo para desligar a mente, relaxar, perder o olhar nas torres da Avenida Paulista, envoltas em uma névoa cinzenta. Na maior parte do tempo, não acontece nada mas, com um pouco de sorte, é possível ver um helicóptero pousando no prédio da prefeitura (será o Dória?) ou uma correria dos vendedores ambulantes fugindo da fiscalização. 

24 Frames tem essa proposta. A diferença é que as paisagens são mais bucólicas. Como o nome diz, são 24 quadros, 24 curtas de 4 minutos e meio cada. O primeiro é a pintura “Caçadores na Neve” (1565), de Pieter Bruegel, o Velho. A paisagem da vila, vista do alto de uma colina, começa a ganhar vida, sai fumaça das chaminés, um corvo pousa no galho de uma árvore, um cachorro faz xixi. Os 23 quadros seguintes têm como base um cenário fotografado pelo próprio Abbas Kiarostami, com predileção para bosques cobertos de neve ou praias desertas. Sobre a foto, são inseridos, por meio de computação gráfica, elementos como neve ou chuva, pássaros, cachorros, vacas e outros animais. Ouvimos o vento, as ondas, o som dos animais. Na maior parte do tempo, não acontece nada mas, com um pouco de paciência, é possível ver um lobo passando ao fundo (será o…?) ou um gato atacando um passarinho distraído. De surpresa, aparece uma foto de Paris ou uma rua asfaltada, distante das paisagens naturais, e inserindo seres humanos. Também inesperadamente, ouvimos música em alguns quadros. 

Para assistir a esse filme, lembre-se: nada é real, deixe de lado qualquer pensamento lógico que possa destruir a ilusão. Não questione por que os galhos da árvore não balançam na ventania ou por que a neve não acumula no dorso do animal. O filme não esconde o fato de ser um truque, uma colagem eletrônica. Entre na brincadeira proposta pelo diretor. Relaxe. Contemple. 

Kiarostami, que faleceu em 2016, trabalhou nesse projeto nos três últimos anos de sua vida. O filme tem relação com o documentário experimental Cinco (2003) e com o curta Me Leve para Casa (2016), ambos exibidos em edições anteriores da Mostra. O primeiro relaciona-se pelo conteúdo: cinco longos planos de uma praia: as ondas, as gaivotas, as pessoas. O segundo relaciona-se pela técnica: são várias fotografias de escadas e, sobre elas, uma bola vai quicando, rolando escadaria abaixo. São “filmes-zen”, minimalistas, geniais em sua simplicidade. 

► Espaço Itaú de Cinema Frei Caneca, sala 2, dia 28/10/17 (sábado), às 21h20 (Sessão 939) 
► Cine Caixa Belas Artes, sala 3, dia 30/10/17 (segunda), às 15h45 (Sessão 1111) 
► Cinesesc, dia 31/10/17 (terça), às 20h10 (Sessão 1215) 
► Instituto Moreira Salles Paulista, dia 01/11/17 (quarta), às 21h50 (Sessão 1385)


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1 comentários:

Ana Rosa disse...

Gostei muito do parágrafo que começa com "Para assistir a esse filme, lembre-se:..."
Bem lembrado, sempre.