FILMES QUE VI NA 44ª MOSTRA DE SP – PARTE 2

02/11/2020 
Por João Moris



Nota de complemento do artigo:

A Mostra acaba de divulgar os filmes que farão parte da sua tradicional Repescagem, que vai do dia 5/11 a 8/11. É uma ótima oportunidade para aqueles que não acompanharam a Mostra ou deixaram de assistir a algum filme que gostariam de ter assistido.

 Um lembrete importante é que ao comprar o ingresso na plataforma da Mostra (https://mostraplay.mostra.org/), você terá no mínimo três dias para assistir ao filme. Uma vez que você clicar Play, você terá apenas 24h para ver o filme. Os filmes estarão disponíveis até às 23h59 do dia 8/11.

Veja os títulos disponíveis da Repescagem no link https://44.mostra.org/jornal-da-mostra/repescagem

 Os títulos mais badalados ou “imperdíveis” da lista abaixo são: A DEUSA DOS VAGALUMES / A PASTORA E AS SETE CANÇÕES / BERLIN ALEXANDERPLATZ / COZINHAR F*DER MATAR / CRIANÇAS DO SOL / DIAS / FILHO DE BOI / LUA VERMELHA / MÃES DE VERDADE / MOSQUITOMATE-O E DEIXE ESTA CIDADE / NÃO HÁ MAL ALGUM /   O CHARLATÃO / PARI / SUOR / VALENTINA

A 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo entrou na sua terceira e derradeira semana. Independente da qualidade dos filmes, um dos grandes méritos deste festival é trazer um panorama realmente diversificado de filmes de vários países, dando a oportunidade aos espectadores de entrar em contato com diferentes culturas e maneiras de ver e estar no mundo. Os ingressos para a maioria dos filmes ainda estão disponíveis até o dia 5/11, podendo ser adquiridos a R$ 6,00 pela plataforma https://mostraplay.mostra.org/


A seguir, mais alguns filmes da Mostra a que assisti por ordem de preferência:

A PASTORA E AS SETE CANÇÕES (Laila Aur Satt Geet – Índia – diretor: Pushpendra Singh)
Um filme indiano surpreendente que foge dos estereótipos de Bollywood ou de filmes com paisagens bucólicas e pouco conteúdo. Baseado num conto do famoso escritor/poeta Vijayadan Detha (1926-2013), esta é uma fábula feminista sem levantar bandeiras. Conta a história de Laila, que é prometida em casamento ao pastor Tanvir, da tribo nômade Bakarwal. Juntos, eles vagueiam pela região da Caxemira até se assentarem em um povoado onde a beleza de Laila enfeitiça todos os homens do local, especialmente o policial Mushtaq, que a corteja implacavelmente. Mas Laila tem outros planos. O filme é uma jornada de autodescoberta de uma mulher e tem o mérito de contar uma história secular adaptada aos dias de hoje, sem perder a força e a magia dos costumes e da tradição.
    
A atriz indiana Navjot Randhawa em A Pastora e as Sete Canções (Foto: Divulgação)

PAI (Otac – Sérvia, França, Alemanha, Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina – diretor: Srdan Golubovic)
Mais um filme que denuncia as mazelas de um sistema doente em plena Europa do século XXI. Nikola é um sérvio simplório, que tem esposa e dois filhos e vive de bicos. Revoltada por estarem passando fome e pelo fato de o marido não ter recebido a indenização devida da empresa em que trabalhou, a esposa ateia fogo ao corpo e Nikola perde injustamente a guarda das crianças. Decide, então, caminhar 300km até a capital da Sérvia, Belgrado, para entregar pessoalmente ao Ministro da Justiça uma petição para reaver a guarda dos filhos. O filme acompanha a dramática odisseia deste pai que, no caminho, encontra corrupção, interesses políticos, iniquidade e muita injustiça social, fruto de um neoliberalismo desenfreado. Para refletir.

DIAS (Rizi – Taiwan – diretor: Tsai Ming-Liang)
Mais uma provocação do aclamado diretor malaio radicado em Taiwan. Desta vez, Tsai Ming-Liang nos brinda com um filme sem diálogos cuja câmera acompanha ritualisticamente o encontro casual de dois homens em Bangkok. O mais velho, Kang, é abastado e sofre de uma dor crônica nas costas e pescoço. O mais novo, Non, vive num cubículo e está tentando ganhar a vida na cidade grande como massagista. Kang contrata os serviços de Non e este breve encontro mostra-se, de alguma forma, revelador para ambos. Um pequeno tratado sobre a solidão e a incomunicabilidade, este filme lento e observacional é como um principiante tentando meditar: difícil no começo, mas uma vez que a mente acompanha o fluxo, pode ser inspirador.

SEM RESSENTIMENTOS (Futur Drei – Alemanha – diretor: Faraz Shariat)
Outro filme sobre a diáspora iraniana, que mostra imigrantes iranianos vivendo em países europeus. Aqui conhecemos o mimado e festeiro Parvis, filho de exilados iranianos e nascido na Alemanha. Na noite de seu aniversário, Parvis rouba uma garrafa de bebida de uma danceteria e é obrigado a prestar serviços comunitários em um centro de refugiados em Hanover. Ali conhece os irmãos iranianos Amon e Banafshe, que aguardam ansiosos por uma resposta da Imigração alemã sobre seu caso. Os três ficam amigos íntimos. Parvis e Amon se apaixonam e têm de enfrentar o preconceito dos outros refugiados iranianos do centro. Questões de identidade cultural, sexualidade e gênero afloram neste filme alto astral e, ao mesmo tempo, reflexivo sobre valores e tradições.

Cena do filme Sem Ressentimento (Foto: Divulgação)

ENTRE O CÉU E A TERRA (Between Heaven and Earth – Palestina, Luxemburgo, Islândia – diretora: Najwa Najjar)
Uma raridade assistir a uma produção palestina que retrata um casal de palestinos classe média vivendo em uma casa estilosa com piscina. Salma e Tamer moram em Ramalá, na Cisjordânia, estão casados há cinco anos e querem se divorciar. Mas, para obter o divórcio eles necessitam autorização da corte israelense. O casal parte, então, de carro para Israel. Salma, cujo pai é israelense, tem direito de ir e vir, mas é a primeira vez que Tamer consegue autorização para atravessar a fronteira de Israel. Nesta jornada, ambos irão descobrir coisas sobre si que desconheciam. Um filme pra lá de simpático, com personagens e situações críveis, ainda que um pouco previsível e certinho. Para quebrar a rotina dos filmes “pesados” da Mostra.

ENTRE MORTES (Sepelenmis Ölümler Arasinda – Azerbaijão, México, EUA – diretor: Hilal Baydarov)
Outra raridade, um filme do Azerbaijão, ex-república soviética. Acompanhamos a jornada solitária de Davu, que ao matar um homem acidentalmente, foge de motocicleta pelo interior do país seguido por três homens e, por onde passa, se depara com situações de morte. Um filme altamente poético e alegórico com um subtexto feminista, que desafia as normas impostas a mulheres que sofrem abusos de diversos níveis em culturas patriarcais, como as da região do Cáucaso. Não é um filme fácil de assistir, mas para aqueles que gostam de obras mais contemplativas, pode ser muito compensador.

O ator azerbaijanês Orkhan Iskandarli em cena do filme Entre Mortes (Foto: Divulgação)

SIBÉRIA (Siberia – Itália, Alemanha, Grécia, México – diretor: Abel Ferrara)
O veterano cineasta Abel Ferrara é um dos poucos diretores realmente autorais dos Estados Unidos, tem uma filmografia extensa, é o queridinho de festivais de cinema e possui um séquito de fãs ardorosos. Seus filmes, quase sempre radicais e instigantes, são meio do tipo “ame-o ou deixe-o”. É o caso de Sibéria, estrelado pelo incansável ator Willhem Dafoe, que vaga pelos confins gélidos do mundo em busca de si mesmo e sabe-se lá mais o quê. No enfrentamento com os demônios do protagonista, o filme adquire tons míticos. Uma jornada para poucos. Não embarquei.

BEANS (Canadá – diretora: Tracey Deer)
Dirigido por uma diretora indígena canadense, este filme é um rito de passagem da pré-adolescente Beans, descendente dos índios Mohawks, que vive numa comunidade ao sul de Montreal. Superprotegida pela mãe (descendente de indígenas) e pelo pai (branco), Beans vai aos poucos entrando em contato com o seu entorno e encontra um mundo muito diferente do seu. O filme tem como pano de fundo um episódio verídico que aconteceu no Quebec em 1990, conhecido como Conflito de Oka, em que um grupo de indígenas se revolta contra a ocupação de suas terras para a construção de um campo de golfe e monta uma barricada numa ponte estratégica de Montreal, impedindo a passagem e causando uma reação violenta da população branca. Apesar da premissa interessante, o filme falha em mostrar a transformação de Beans e também o desenvolvimento do conflito, ficando no meio do caminho. Não me entusiasmei.

As atrizes Kiawentiio e Rainbow Dickerson em cena do filme Beans (Foto: Divulgação)

EM MEUS SONHOS (Bir Düs Gördüm – Turquia – diretor: Murat Ceri)
Vários filmes vindos da Turquia retratam a vida rural do país, muitas vezes de forma pasteurizada. É o caso deste filme pastoral enfadonho, que conta a história do garoto Tarik, de oito anos, que sofre um acidente de carro com os pais e, órfão, se vê obrigado a viver com os avós no interior da Turquia. É neste contexto que Tarik vai aprender a se relacionar com um mundo totalmente diverso do seu e a descobrir o valor da amizade, o carinho dos avós e a vida na fazenda, enquanto sonha com a mãe que aparece vestida de branco com roupas esvoaçantes. Sim, você já viu este filme fofo antes e provavelmente era turco.

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